PUBLICAÇÕES

Institucional

Entrevista com J Fernando Rossi

18 julho 2019 - 5:44

Entrevista com J Fernando Rossi

Com mais de 40 anos na medicina, o experiente J Fernando Rossi comanda a presidência da Abramge Minas. Em entrevista, ele avalia o momento atual da medicina de grupo, os desafios e aponta caminhos para o equilíbrio do setor.

JUVERCY JUNIOR

Como está o seu humor em relação ao comando da presidência da Abramge?

Eu me sinto muito honrado em estar na presidência da Abramge. Me sinto com alguma tranqüilidade e posso dizer até feliz, mas nós temos que continuar a objetivar o crescimento do nosso segmento em Minas Gerais.

Fale-nos um pouco do seu histórico na área da saúde e formação.

Me formei em medicina em 1969, fiz mestrado de ginecologia e obstetrícia e em 1972 comecei a trabalhar com planos de saúde. De lá pra cá, tenho uma série de cursos, muitos deles no Brasil e outros no exterior, cursos esses visando aprimorar administração e gestão de operadoras de planos de saúde.

 

Na sua avaliação, a medicina de grupo vive um momento complexo?

Vive um momento muito complexo, complicado e difícil. E esse foi exatamente um dos fatores que me motivou a retornar para a presidência da Abramge. Isso porque nós temos muita coisa para realizar e melhorar para o futuro da medicina de grupo.

 

O senhor pode nos citar alguns desafios?

Os desafios são inúmeros. Os desafios começam desde a criação da ANS, que proporcionou um desequilíbrio no relacionamento entre os participantes do segmento da medicina supletiva. A ANS foi criada com uma função básica de reorganizar o mercado, mas exerce uma atuação bem diferente do que nós pensávamos. Então eu acho que além dos desafios impostos pela agência, hoje nós temos outros maiores no relacionamento com médicos, hospitais, laboratórios, Poder Judiciário , mídia e outros envolvidos no processo. A cada dia eu vejo uma perspectiva mais complexa para a medicina de grupo, daí a razão de eu voltar motivado para fazer uma reaproximação desses participantes do processo.

A crise econômica no país pode afeta o setor diretamente?

Afeta, e muito. O que nós vimos é que nos últimos cinco, seis anos foi um cenário alarmante. Apesar de todos dizerem que temos uma taxa de desemprego pequena, o que se percebe é o contrário. As empresas estão cada dia diminuindo os seus quadros de empregados , reduzindo o faturamento das Operadoras e permanecendo o risco.Pois bem , o princípio da mutualidade fica comprometido no seu aspecto econômico , daí , a crise econômica dificultou bastante e deve complicar mais nos próximos dois, três anos.

A cada dia que passa as exigências da agência reguladora crescem. O senhor acha que falta diálogo com as empresas?

Eu acho que sim . Conforme eu disse, a ANS deveria orientar naquelas situações em que possa haver divergência entre lei e a operadora, e não punir com tanta severidade como tem punido.

Para você ter uma ideia, a ANS é a única agência no Brasil que cuida de prestações de serviços e que aplica multas que variam de R$ 10 mil a R$ 1 milhão. Em nenhuma outra agência reguladora de serviços a gente vê isso. Por exemplo, na aviação aérea, onde existe problema a todo momento, as multas são bem inferiores. Então esse eu acho que foi um critério terrível por parte da ANS. Além das exigências de capitalização, de manutenção de reservas, de equivalência e ressarcimento ao SUS.

Será que a ANS adota esse punho de ferro por achar que as empresas estão, digamos, nadando em dinheiro?

Isso vem de longe. A ANS deveria exercer uma atividade de fiscalização, e não punição nos moldes que pratica. Agora, isso advêm de um conceito que existia de planos de saúde de antigamente, em que meia dúzia de pessoas se juntavam, criavam uma empresa, arrecadavam e fugiam com o dinheiro. Isso não existe mais no Brasil, e se existisse seria caso de Polícia Federal. Não é uma situação para a ANS. Então essa normatização foi válida, mas não com tamanha severidade como foi feita, refletindo, dia a dia, nas empresas que não estão aguentando essa fiscalização.

O senhor acredita que a medicina de grupo conseguirá crescer, até mesmo no ponto de vista financeiro, com esse cenário atual?

Eu acho muito difícil. A tendência do segmento é exatamente acontecer o que ocorreu nos Estados Unidos, onde os grandes engoliram os pequenos, e nós estamos vivendo esse momento no Brasil. Visto aí várias empresas maiores já atuando no mercado e buscando empresas menores. Isso já está acontecendo há uns quatro anos e daqui para frente vai acontecer mais. É uma realidade de mercado. Mas, precisa ser lembrado que essa situação existe devido às normatizações criadas pela lei 9656/ 98 e suas centenas de resoluções e atos normativos.

Qual a sua visão para o futuro?

A perspectiva de futuro para a medicina de grupo, tanto nas grandes quanto nas médias operadoras, é um futuro muito preocupante porque os custos operacionais estão crescendo.

Para se ter uma ideia, existe uma inflação acumulada de seis, sete anos atrás que já está mais de 100%. E não há como recuperar isso porque a ANS não te proporciona reajuste suficiente para equilibrar essa conta. Então eu considero o futuro ainda muito sombrio, mas, nós não podemos perder o norte, temos que nos manter motivados para que continuemos trabalhando, buscando soluções de acordo com o momento do país.

Com as novas normas criadas pela ANS, bem como novos benefícios aos usuários do sistema, isso afetou duramente o setor?

Existe uma máxima que a gente escuta toda hora que diz; não existe almoço de graça. Então tudo aquilo que você pede, tem que pagar. Mas infelizmente na cabeça do governo isso não acontece, não sei , talvez no governo seja diferente. Mas no nosso caso não, tudo aquilo que é acrescido em termos de benefícios, seja de farmácia, de ótica, de novas coberturas, isso tem um custo, e esse custo tem que ter um repasse. Atualmente, esse custo não está sendo repassado adequadamente pela ANS. Ela determina um número para você reajustar, mas muitas vezes a gente fica no ar. Ora, se temos honorários , materiais, medicamentos, diárias e taxas reajustando em uma média de 30% ao ano, isso representa mais que o INPC . A matemática não fecha. É preciso um canal de diálogo com a ANS, caso contrário, vai saindo um por um do mercado .

O senhor não acha que os prestadores de serviços deveriam ser mais maleáveis nas exigências?

É a outra ponta da pirâmide, o prestador de serviço não quer saber onde você vai buscar dinheiro para paga-lo. Ele quer reajuste e se você não acertar com ele, ele para de atender, cria dificuldades e por aí vai. É preciso então que o médico, hospital, laboratório, tenham essa sensibilidade de enxergar o momento difícil que estamos atravessando.

Qual a mensagem que o senhor mandaria para os empresários da medicina de grupo?

Eu sempre disse o seguinte; eu não sei se é sina ou se é saga, a medicina de grupo sempre andou e pautou pelo excesso de trabalho em busca de soluções e, até por incrível que pareça, sempre foi mal reconhecida no país, como uma atividade suplementar. Mas eu acho que nós ainda temos condições de nos mantermos no mercado, trabalhando com seriedade, respeito e ética, na busca de crescimento.

< VOLTAR